Instituições do Velho Testamento




 


  
O Povo da Aliança
Os homens, que habitavam a Palestina há dois mil anos atrás, pelo menos a sua maioria, estavam convencidos de que não se acham ali por acaso: tinham certeza de que a sua presença nesse país possuía um significado sob a Providência Divina e que o próprio Deus os estabelecera nessa terra.
Um orgulho nacional enchia o coração do judeu mais humilde quando se lembrava de que pertencia à raça escolhida, ao povo da aliança. O judeu sabia que nenhuma nação da terra possuía um privilégio como o deles.
A nação de Israel surgiu de uma revelação bastante antiga e que se mantinha sempre presente no coração de toda a nação. Um homem chamado Abrão, que vivia em Ur, capital da região na parte inferior do Eufrates, recebera uma visitação de Deus e ouvira sua ordem: “Sai da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai, e vai para a terra que te mostrarei: de ti farei uma grande nação, e te abençoarei, e te engrandecerei o nome” (Gênesis 12:1 e 2). Abrão obedeceu. Ele seguiu pelas trilhas do deserto, disposto a correr os riscos de uma grande jornada a mando do Senhor. Esta obediência foi recompensada. Abrão recebeu do Senhor advertências e promessas. E, como garantia das promessas feitas por Deus, o nome de Abrão foi mudado para Abraão (“pai de uma multidão”) e de forma milagrosa sua esposa já velha lhe deu um filho.
Esse foi o início daquela aliança que sempre existira desde tempos antigos entre o Senhor Todo-Poderoso e os que se diziam seus servos. Um sinal físico dessa aliança tinha sido estabelecido, um sinal na própria carne do homem: a circuncisão. Se, porém a aliança tinha sido estabelecia de uma vez por todas, as condições de sua aplicação haviam mudado no curso dos séculos: as obrigações tinham ficado mais pesadas e se aprofundado mais.
No início, na era dos patriarcas, as condições eram extremamente simples. Para manter a fé bastava crer no Deus único, naquele referido com “El”, ou melhor ainda “Elohim”. Este Deus único quase não exigia adoração, sacerdócio, nem templo e pouco mais do que alguns sacrifícios de tempos em tempos. Ele não impunha uma ética a seus servos, e as doutrinas instituídas por esta religião eram bem simples.
500 a 600 anos depois de Abraão, um homem foi escolhido por Deus para livrar o seu povo da escravidão no Egito e levá-lo de volta à Terra Prometida, esse homem chamava-se Moisés. Sob a liderança de Moisés, os israelitas fugitivos cruzaram o Mar Vermelho e foram então protegidos da morte no deserto. Nessa ocasião a aliança não só foi renovada, mas também expressa com maior exatidão: Deus deu a seu povo uma nova garantia, revelando-lhes seu nome extraordinário, Yaweh – a marca de sua onipotência – Yaweh – “Aquele que é”! Em troca o Senhor lhes impôs mandamentos, as famosas leis, ou seja, os Dez Mandamentos e, baseado neles, Moisés pôde, mais tarde, dedicar-se inteiramente ao desenvolvimento de um código moral e religioso, um código de uma organização política e social.
Assim confirmada e explicada, a aliança permitiu que as tribos tomassem a terra de Canaã nos dias de Josué e dos juízes. Foi novamente a aliança que estabeleceu o rei Davi.
Independente de todas as provas da infinita bondade de Deus, dedicada ao seu povo, esse Povo Escolhido muitas vezes desrespeitara a aliança, cedendo às tentações da idolatria e às práticas imundas realizadas por outros povos. Assim, Deus enviou vozes extraordinárias para que falassem e intercedessem por este povo rebelde – os profetas (Amós, Oséias, etc). Um terrível castigo veio sobre a nação infiel de Israel: foram levados para a Babilônia. Era o exílio. Mas a misericórdia de Deus continuava sendo maior do que a sua justiça: Yaweh permitiu que este castigo tivesse um fim, e que o rebanho exilado voltasse para esta terra mais abençoada que todas as outras.
A provação foi proveitosa. Graças ao Exílio, o Povo Escolhido, e por meio de outros profetas, (Isaías, Ezequiel, Jeremias, etc), recebeu a mensagem de que tudo que vem de Deus deve ser adorado e que tudo colabora para o aperfeiçoamento do homem. A aliança tomou um significado ainda mais profundo: ela se tornou a base de uma religião mais interior, mas espiritual. A missão que o Povo Escolhido sabia ser sua responsabilidade não era mais então simplesmente confirmar a existência de um único Deus e proclamar os seus mandamentos, mas sim ensinar a humanidade a buscar o que é divino pelo esforço pessoal, a purificação moral, e o empenho da alma. A circuncisão, “o sinal da aliança na carne”, era ainda obrigatória, mas todos sabiam que, como Paulo diria mais tarde, a verdadeira circuncisão era interior, algo ocorrido dentro do coração humano.
Tudo estava então relacionado com a certeza do Povo Escolhido de que era único, diferente de todos os demais e superior a eles. Tudo, a sua fé em um único Deus, amor pelo país, submissão às leis morais, desejo de manter em ordem sua vida social e política segundo princípios estabelecidos, e seu desejo de alcançar uma experiência espiritual muito mais sublime.


Lei da hospitalidade e do Asilo

A hospitalidade é uma necessidade da vida no deserto, necessidade que veio a ser uma virtude e uma das mais estimadas entre os nômades. O hóspede é sagrado: recebê-lo é uma honra disputada. O forasteiro pode desfrutar dessa hospitalidade durante 3 dias e, quando vai embora, ainda lhe é devida proteção, cuja duração é variável: em algumas tribos “até que tenha saído de seu ventre o sal que comeu”, nas grande tribos, como no caso da Síria, por mais outros 3 dias e em um ráio de 150 quilômetros.
Abraão recebeu os 3 homens em Manre (Gênesis 18:1 a 8); Labão apressa-se para acolher o servo de Abraão (Gênesis 24:28 a 32). Ló recebeu dois anjos em Sodoma (Gênesis 19:1 a 8) e em Juízes 19:16 a 24, no caso do crime de Gibeá, mostram até que extremos podia chegar o sentimento de hospitalidade. Ló e o ancião de Gibeá estão dispostos a sacrificar a honra de suas filhas pela proteção de seus hóspedes, e dá-se a razão disso: é só porque esses estavam sob a proteção de seus tetos (Gênessi 19 e Juízes 19).
Outra consequência da vida nômade é a lei de asilo. Nesse estado social é impossível e inconcebíbel a existência de um indivíduo isolado, que não pertença a nenhuma tribo. Se um homem é excluído de sua tribo por causa de um homicídio ou de uma ofensa grave ou se ele mesmo retira-se dela por qualquer razão, ele deve buscar a proteção de alguma outra tribo.
No Antigo Testamento encontramos as cidade de refúgio. As cidades de refúgio dos países antigos eram, essencialmente, medidas judiciais auxiliares, para ajudar o escape dos homicidas involuntário. Visto que o código de vingança era forte, os parentes de uma pessoa morta por outrem matavam sem misericórdia o culpado pelo homicídio, sem temer qualquer ação da parte da lei. A lei da retribuição, em Israel, requeria punição igual ao crime (Gênesis 9:6; Êxodo 21:12 a 14; Levítico 24:17; Ezequiel 18:20).
Lemos que era considerado um dever: o parente de um homem morto justiçar o assassino, mesmo que o homicídio tivesse sido feito involuntariamente, mesmo que com razão, em defesa própria. Os lugares de refúgio incluíam os templos, os santuários e os lugares santos de todas as variedades. No território de Israel, seis cidades levitas foram separadas com essa finalidade. Mas elas visavam somente os casos de homicídio acidental. Os criminosos eram protegidos nessas cidades. Essas cidades serviam para modificar a inflexibilidade das leis vigentes. Essas cidades eram as seguintes (Josué 20:7 e 8):
·         Cades – cerca de 25 Km ao norte do mar da Galiléia.
·         Siquém – localizada no fim do vale que tinha um formato de “V”, na linha leste-oeste, entre o monte Ebal e o monte Gerigim.
·         Hebrom (Quiriate-arba) – em Judá, cerca de 32 km ao sul de Jerusalém.
·         Bezer – nas terras altas orientais a leste de onde o rio Jordão deságua no mar Morto.
·         Ramote – cerca de 80 km mais para o norte, nas terras altas de Gileade.
·         Golã – nas terras altas a leste do mar da Galiléia.
A exata localização desta última é desconhecida. Essas cidades estavam localizadas em lugares estratégicos, dando aos habitantes de cada tribo um lugar de refúgio, não muito distante.
O trecho de Êxodo 21:14 dá a entender que um assassino proposital não podia esperar proteção em frente do altar; mas um homicida acidental podia fazê-lo, por algum tempo. As leis de Israel não proviam a remoção da culpa pelo homicídio, mas a morte do sumo sacerdote, então atuante, permitia que o homicida circulasse livremente, sem temor de retaliação.
Alguns supõem que a morte do principal sacerdote da área tinha o mesmo efeito. Requeria-se que as estradas que levavam às cidades de refúgio fossem mantidas em boas condições (Deuteronômio 4:41 a 43 e 19:1 a 13).
Havia qualificações específicas para aqueles que buscassem as cidades de refúgio, e os anciãos das cidades tomavam decisões referentes a cada caso. As cidades de refúgio provavelmente eram lugares de grande atividade; mas, curiosamente, não temos qualquer relato no Antigo Testamento que ilustre isso.
Se os anciãos de uma cidade decidissem, de modo favorável ao homicida, ainda assim este precisava confinar-se na cidade de refúgio, até a morte do sumo sacerdote (Números 35:25ss), tornando tal refúgio um tipo de aprisionamento. Em outras palavras, os homicidas involuntários ainda assim pagariam uma pena.
As cidades de refúgio, obviamente, representam o refúgio que temos em Cristo, o qual é nosso sumo sacerdote. A sua morte livrou-nos do temor ou retaliação do pecado, até onde está envolvido o destino da alma. A lei de Moisés era um código de justiça, e a misericórdia não era, então, um conceito tão presente como se vê em nossos dias. Apesar disso, as cidades de refúgio envolviam certa medida de misericórdia. Porém, em Cristo, o pecador perdoado fica inteiramente livre da culpa e das consequências eternas do pecado.
 



A organização das tribos


1.    Constiuição das tribos

A tribo é um grupo outônomo[1] de famílias que se consideram descendentes de um mesmo antepassado. Ela é denominada segundo o nome ou o sobrenome de seu antepassado, precedido ou não de “filhos de”. No lugar de “filho”, pode-se dizer “casa” (no sentido de família, descendência).
O que une os membros de uma mesma tribo é o vínculo de sangue, real ou suposto: todos são considerados “irmãos”, em um sentido amplo. Abimeleque disse a todo o clã[2] de sua mãe: “Lembrai-vos de que sou vosso osso e carne” (Juízes 9:2b). Todos os membros do clã (tribo) de Davi são para ele “irmãos” (1º Samuel 20:29), e a todos os anciãos de Judas ele diz: “Vós sois meus irmãos, meu osso e minha carne” (2º Samuel 19:13).
Cada tribo possui tradições próprias sobre o antepassado do qual descende. Essa ideia dirigiu a composição das grandes genealogias. Cada tribo se reporta[3] a um antepassado único. Essas genealogias podem ser exatas quando se trata de um pequeno grupo, contudo, pode haver perda de informação com a distãncia entre os descendentes.
De fato, além da descendência de sangue, muitos outros elementos podem intervir na constituição de uma tribo. A comunidade de moradia conduz à fusão de grupos familiares. Elementos fracos são absorvidos por um ambiente mais forte, ou muitos grupos fracos se juntam para formar uma unidade capaz de permanecer autônoma, ou seja, capas de resistir aos diversos ataques. Com relação aos indivíduos, sua incorporação a uma tribo pode realizar-se por adoção de uma família. Contudo, o princípio é mantido, pois o recém-chegado é ligado “por nome e sangue” à tribo, ou seja, reconhece o antepassado da tribo como seu próprio antepassado, se casará dentro da tribo e fundará uma descendência.
As tribos de Israel não escaparam a esses contratempos e também tiveram que absorver grupos de origem diferente. Assim, a tribo de Judá acabou acolhendo os remanescentes da tribo de Simeão, e também incorporou grupos estrangeiros, os calebitas, os jerameelitas, e outros. O processo seguido é claramente indicado na Bíblia a respeito dos calebitas: eles eram originariamente afastados da sociedade israelita, pois Calebe era filho de Jefoné, o quenezeu (Números 32:12; Juíses 14:6 a 14; Gênesis 15: 19 e 36:11), mas relacionaram-se em Israel desde a estada em Cades, onde Calebe foi designado representante de Judá como espia para a exploração de Canaã (Números 13:6); sua integração a esta tribo vem indicada em Josué 15:13 e Josué 14:6 a 15. Finalmente, Calebe é ligado geneologicamentea a Judá: o filho de Jefoné torna-se filho de Hesrom, filho de Perez, filho de Judá (1 Crônicas 2:9,18 e 24), e irmão de Jeremeel (1 Crônicas 2:42), outro grupo estrangeiro (1º Samuel 27:8 a 12), também unido ao tronco de Judá (1 Crônicas 2:9). Sem dúvida fusões semelhantes aconteceram com frequência, especialmente no princípio, esse tipo de situação poderia ter acontecido em vários outros momentos da história de Israel e não podemos dizer hoje se essas fusões eram erradas ou não, contudo, elas aconteceram e todos que foram inseridos foram aceitos como membros legítimos da tribo.

2.    Agrupamento, divisão e desaparecimento das tribos
As 12 tribos de Israel foram uma confederação[4] e conhecem-se agrupamentos semelhantes de tribos árabes. Às vezes, se trata somente de pequenas tribos que se unem para formar uma frente comum contra vizinhos poderosos, com foi dito anteriormente. Outras vezes trata-se de tribos que têm certa origem comum, que provêm da divisão de uma tribo que se tornara muito numerosa. Essas tribos conservam o sentimento de seu parentesco e podem unir-se para realizar obras em comum, migrações ou guerras, e, nesse caso, reconhecem um chefe obedecido por todos os grupos ou por parte deles.
Israel conheceu uma situação parecida durante sua estada no deserto e durante a conquista de Canaã, situação que se prolongou após a sedentarização[5], durante o período dos juízes. As 12 tribos de Israel eram ligadas pela religião: juntamente com o sentimento de seu parentesco, a fé comum em Yawéh, que todos seguiam, Josué 24, era o vínculo que unia as tribos ao redor do santuário da arca (o Tabernáculo) onde se encontravam por ocasião das grandes festas.
Pode acontecer também que um grupo, muito numeroso para poder conviver e utilizar os mesmos pastos, se dividia e formava dois grupos, que vivem em plena independência. Desta maneira se separaram Abraão e Ló (Gênesis 13:5 a 13). Contudo, os deveres de parentesco subsistem, e quando Ló é levado cativo pelos 4 reis vitoriosos, Abraão corre em seu auxílio (Gênesis 14:12 a 16).
Uma tribo, em vez de crescer, pode simplesmente ir diminuindo e, por fim, desaparecer, assim como aconteceu com Rúben, Levi, Simeão que foi absorvido por Judá (Gênesis 34, 49, Josué 19, Juízes 1 e Deuteronômio 33).

3.    Organização e governo da tribo
Mesmo que forme um todo, a tribo, em uma organização interna, foi fundada também nos vínculos de sangue. Em Israel a unidade da tribo é a família, que corresponde não só ao pai, sua esposa ou esposas e seus filhos não casados, mas também aos filhos casados com suas esposas e filhos e a criadagem. Várias famílias constituem um clã, que vive originalmente no mesmo lugar, ou se reúne para festas religiosas comuns e refeições sacrificiais. O clã é dirigido pelos chefes de família ou anciãos. Em tempo de guerra, fornece um contingente bem grande que fica às ordens de um chefe. O conjunto de clãs constiuiu uma tribo. A tribo congrega todos os que obedecem a um líder maior, que obviamente, comanda todos os clãs.

4.    Território da tribo, guerra e razia
Cada tribo tem um território que lhe é reconhecido como próprio e dentro do qual as terras cultivadas estão geralmente sob o regime de propriedade privada, mas os pastos são comuns. Os limites são, às vezes, flutuantes e se dá o caso de que, grupos que pertencem a tribos diferentes, consigam dividir harmoniozamente os bons pastos. Mas a tribo que pertence o pasto em questão pode impôr condições e exigir direitos de pastagem.
Pode haver facilmente disputas por direitos no caso do uso de poços ou cisternas. No deserto, todo mundo deve saber que poço pertence a tal grupo, mas acontece que ás vezes os títulos são questionados e surgem assim contendas entre os pastores. Isso aconteceu com os pastores de Ló que disputavam com os pastores de Abraão (Gênesis 13:7); os servos de Abimeleque e Abraão (Gênesis 21:25) e Isaque (Gênesis 26:19 a 22).
Se os conflitos não se resolvem amistosamente, como nos exemplos bíblicos, dão lugar a guerra. Na guerra, o despojo é repartido entre os combatentes, mas o líder tem direito a uma parte especial, que antigamente era a 4ª parte do recolhido. Em Israel, na época de Davi, o saque era repartido pela metade com os combatentes e os que ficavam na retaguarda, ficando sempre uma parte reservada ao líder (1º Samuel 30:20 a 25). Cada tribo tinha o seu grito de guerra e a sua bandeira. Em Êxodo 17:15 lemos: “O Senhor é a minha bandeira”.
A razia é diferente da guerra: nela não não se trata de matar, mas de saquear e fugir sem sofrer danos. É o esporte nobre do deserto; supõe o uso de camelos de corrida e de éguas de raça, e tem regras fixas. Na antiguidade os israelitas não conheceram nada parecido. O que mais se parece com a “razia” são as incursões dos midianitas e dos filhos do Oriente, montados em seus camelos, na época dos juízes (Juízes 6:3 a 6); e, de forma mais branda, as expedições de Davi ao Neguebe durante sua estada entre os filisteus (1º Samuel 27:8 a 11).




[1] Autônomo: independente


[2] Clã: Um clã constitui-se num grupo de pessoas unidas por parentesco e linhagem e que é definido pela descendência de um ancestral comum.


[3] Reportar: Ato de lembrar algo que tenha sido feito no passado.


[4] Confederação: É uma associação ou aliança de várias nações para um fim comum.


[5] Sedentarização: é basicamente quando um povo deixa de ser nômade para se fixar e lugar próprio. Processo por meio do qual o homem passa a habitar de forma fixa, a partir das práticas agrícolas. Assim, ele deixa de ser nômade, isto é, deixa de viver permanentemente mudando de lugar.


Lei do Nazireado 

A melhor tradução para o termo “nazireu” é “separar”, “consagrar”, “abster-se”, ou até “coroa de Deus”, termo algumas vezes aplicado a cabeleira não-tosquiada dos narizeus, cabeleira que era considerada sua coroa ou adorno.
O voto do nazireado envolve a consagração especial de pessoas ou coisas a Deus (Gênesis 49:26 e Deuteronômio 33:16). Os nazireus formavam grupos piedosos[1] do judaísmo. Os nazireus precisavam abster-se de vinho, de todas as bebidas alcoólicas, de vinagre, até de uvas e uvas passas. Também não podiam tocar em coisas imundas, como um cadáver, mesmo que se tratasse de um parente próximo. Não podiam cortar[2] os cabelos durante todo o tempo em que durasse a sua consagração. Entre os antigos hebreus, esse voto era vitalício[3], como no caso de Sansão.
Amós 2:12 (“Mas vós aos nazireus destes a beber vinho e aos profetas ordenastes, dizendo: Não profetizeis.”) sugere que os nazireus eram pessoas de grande prestígio em Israel. Contudo, com o passar do tempo, a lei judaica passou a permitir que tais votos fossem limitados quanto ao tempo, mas uma coisa que nunca foi abandonada foi a severidade, ou seja, a firmeza quanto a piedade do nazireu. Números 6: 1 a 21 traz um relato de como seria a Lei do Nazireado.
Sansão, Samuel e João Batista foram nazireus segundo muitos estudiosos, e foram nazireus vitalícios, mas como foi dito anteriormente, o voto poderia ser realizado por um limitado período de tempo, porém nunca menor a trinta dias.
A cabeleira crescida dos nazireus simbolizava: virilidade e virtudes heróicas. As mexas de cabelos simbolizavam uma simplicidade infantil, poder, beleza e liberdade. Acreditava-se que a dignidade dos nazireus equivalía-se a de um sumo sacerdote. Os nazireus tinham por objetivo uma vida de separação e um modo de viver santo e reservado.
Os pais poderiam dedicar sus filhos homens a esse grupo religioso e separado. Os nazireus não viviam em comunidade separadas, e nem lhes era impedida a associação com outras pessoas, ou de se ocuparem com atividades comuns, podendo casarem-se caso desejassem. Viviam na comunidade de Israel como símbolos de dedicação especial a Deus, o Senhor. Essa era a principal função dos nazireus, e mostravam-se ativos nas práticas religiosas e em uma vida de santidade dedicada ao Senhor.
Se os votos do nazireado fossem violados em qualquer sentido (até mesmo por acidente, como quando um nazireu entrava em contato com um cadáver), ele precisava renovar todo o cunjunto de ritos purificadores, e começar de novo os seus votos.
Ao fim do tempo marcado, um nazireu precisava oferecer vários sacrifícios, cortanto rente os cabelos e queimando-os no altar. Em seguida, o sacerdote efetuava certos ritos determinados, e aquele homem que havia feito o voto estava desobrigado de seus votos com o Senhor.


[1] Piedoso: pessoa religiosa com um amor e respeito intenso pelas coisas do Senhor.
[2] Não cortar os cabelos: Escritos antigos mostravam que os cabelos de uma pessoa eram considerados a sede de sua vida, e até mesmo a habitação de espíritos e de influências mágicas. Talvez por essa razão é que, terminado o voto do nazireado, a pessoa precisava raspar seus cabelos e queimá-los, como medida eficaz para anular quaisquer poderes que os cabelos fossem tidos como possuidores
[3] Vitalício: que dura à vida inteira.

Sacerdotes levitas


Na antiga cultura hebreia, qualquer homem podia ser sacerdote, se mostrasse possuir a capacidade para tanto. Mas durante o período patriarcal, o sacerdócio era desempenhado pelo cabeça de uma família, como no caso de Abraão (ver Gênesis 8:20; 22:13; 26:25 e 33:20). Os sacerdotes, por muitas vezes, tornavam-se líderes nacionais, conforme se vê no caso de Melquisedeque. Embora seja muito duvidoso que ele fosse um hebreu, é certo que ele era semita[1]. E também podemos pensar no caso de Moisés, que foi líder nacional e sacerdote.

Nos tempos de Moisés, os sacerdotes eram todos da família de Aarão. Sendo assim, é correto dizer que todos os sacerdotes pertenciam à tribo de Levi, por meio de Aarão, mas nem todos os descendentes de Levi eram sacerdotes, ou seja, apenas os descendentes de Aarão eram sacerdotes. São estes os descendentes de Levi até Aarão: Levi, Coate, Anrão, Aarão (irmão de Moisés). Aarão foi pai de Nadabe, Abiú, Eleazar e Itamar. Coate, pai de Anrão e avô de Aarão teve 4 filhos: Anrão, Isar, Hebrom e Uziel.

Apesar dos sacerdotes serem prioritariamente descendentes de Aarão, houve casos onde Deus encontrou descendentes de Levi (e também não descendentes de Levi), e a estes lhe deu a autoridade de exercer poderes sacerdotais, como no caso de Samuel. Seus pais foram Elcana e Ana. Elcana era levita descendente de Coate, mas não da linhagem aarônica (1 Crônicas 6:26 a 33). Podemos também dizer que Salomão foi rei e sacerdote, mas não pertencia à tribo de Levi, e sim à tribo de Judá. Os profetas também desempenhavam certa função sacerdotal, não formalmente no tabernáculo ou no templo. Em certo período da história de Israel, juízes exerceram tanto a função de sacerdote como de juiz, como o exemplo de Gideão.

Os sacerdotes eram ordenados a seu ofício e às suas funções mediante um elaborado ritual que é descrito em Êxodo 29 e Levítico 8. Eles usavam vestimentas especiais, como sinal de seu ofício, e cada peça de seu vestuário, ao que se presume, tinham significados simbólicos específicos (Êxodo 28).

O sumo sacerdote estava encarregado de certos deveres especiais, que só ele podia cumprir: como oficiar no dia da expiação, entrando no Santo dos Santos com esse propósito, e servindo de principal oráculo do sacerdócio. Também tinha o dever de oferecer a refeição diária (Lv 6:19).

Os sacerdotes comuns realizavam todos os sacrifícios (Lv 1 a 6), cuidavam de questões sobre alimentos próprios e impróprios (Lv 13 a 14), e estavam encarregados de diversos outros deveres secundários (Nm 10:10 e Lv 23:24 e 25:9). Os sacerdotes eram sustentados mediante os dízimos, primícias dos campos, primícias dos animais e porções de vários sacrifícios (Nm 18).
A função original de um sacerdote era a de ser o intermediário de um oráculo, alguém que dava instruções por inspiração divina, segundo dele se esperava. E isso continuou a ser uma parte importante do ofício sacerdotal, principalmente no caso do sumo sacerdote. Os sacerdotes também eram guardiães e mestres dos documentos e das tradições sagradas. Os profetas também compartilhavam dessas atividades, de certa forma, atuavam quase que como sacerdotes, embora sem fazerem parte do corpo sacerdotal de maneira formal e genealógica.
Os sacerdotes guardavam os rituais sagrados, os quais promoviam o conhecimento sobre a santidade de Deus e a necessidade dos homens aproximarem-se Dele sem a poluição do pecado, mediante os holocaustos apropriados e a mudança de vida.
Os sacerdotes queimavam o incenso sobre o altar de ouro, no lugar santo, o que era mesmo um símbolo das funções sacerdotais. Também cuidavam das lâmpadas, acendendo-as a cada novo começo de noite e arrumavam os pães da proposição sobre a mesa a cada sábado (Êxodo 27:21; 30:7 e 8; Levítico 24:5 a 8).
Os sacerdotes mantinham a chama sempre acesa no altar dos holocaustos (Lv 6); limpavam as cinzas desse altar (Lv 6); ofereciam os sacrifícios matinais e vespertinos (Ex 29); abençoavam ao povo, após os sacrifícios diários (Lv 9 e Nm 6); aspergiam o sangue, e depositavam sobre o altar as várias porções da vitima sacrificial (do animal sacrificado ao Senhor); sopravam as trombetas de prata e o chifre do jubileu, por ocasião de festividades especiais; inspecionavam os imundos nos casos de lepra e aqueles que eram curados (Nm 6, 13 e 14); administravam o juramento que uma mulher deveria fazer quando acusada de adultério (Nm 5); eram os mestres da Lei e agiam como juízes quanto às queixas do povo, tomando decisões válidas quanto aos casos apresentados (Dt 17 , 19 e 21).



[1] Semita: O termo semita tem como principal designação o conjunto linguístico composto por uma família de vários povos, entre os quais se destacam os árabes e hebreus, que compartilham as mesmas origens culturais. A origem da palavra semita vem de uma expressão no Gênesis e referia-se a linhagem de descendentes de Sem, filho de Noé. Modernamente, as línguas semíticas estão incluídas na família camito-semítica. Historicamente, esses povos tiveram grande influência cultural, pois as três grandes religiões monoteístas do mundo - judaísmo, cristianismo e islamismo - possuem raízes semitas.

 








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